Hoje, ao acordar, senti uma imensa alegria no meu coração. Bom... Deixa eu explicar o porquê. Ao abrir a janela, o dia estava tão lindo. Parecia um lindo quadro feito por um pintor de grande talento. Olhei para o céu e vi nuvens tão branquinhas, tão bem desenhadas. Umas pareciam cachorrinhos, outras pombinhas, outras peixinhos. Elas estavam ali tão cuidadosamente colocadas para contrastar com o imenso azul. E o sol brilhava e aquecia minha alma e meu coração. Olhei para as montanhas verdejantes e pude ver imensos rebanhos de ovelhas com  pastores os conduzindo cantando uma melodia suave. Existe coisa mais linda? Às vezes tenho a sensação de que Deus capricha em certos detalhes que chegam a ofuscar minhas vistas. Sou grata a Deus por poder enxergar, por poder contemplar tanta coisa boa. Amo percorrer os olivais e ver as folhas tremeluzentes e azeitonas em abundância,  percorro também as vinhas e experimento de seu fruto.  São uvas doces e suculentas e enormes. E o rio que corta minha cidade. Tão caudaloso, tão imponente e com tanta história para contar. Confesso que nunca saí daqui,  e nem penso em ir para outras cidades, porque amo muito tudo isso. Enfim, sou grata ao Deus eterno por me presentear todos os dias com tanta beleza, também por eu ter uma família tão boa que se preocupa comigo e me ensina sobre as leis de Deus.

Desculpe a demora. Nem sempre dá para eu vir aqui escrever, mas quero te contar uma coisa bem legal. Hoje, eu conheci um menino muito especial. A gente ficou conversando por longas horas sentados na grama e jogando pedras no regato. Falamos de tudo, desde uvas doces, até ovelhas desaparecidas. Ele falou também sobre rumores de guerra. Mas eu não acredito muito que a guerra chegue aqui na minha região. Ah... Ele falou que se encontrou com o profeta dia desses. Relatou os feitos do profeta... de como ressuscitou uma criança  e multiplicou o pão. Eu já gostava do profeta,  sabendo dessas coisas, passei a admirá-lo ainda mais. Muitas pessoas acham ele meio estranho, mas normalmente não gosto de seguir a opinião da maioria. Eu gosto do profeta porque ele fala a verdade e é muito difícil isso nos nossos dias. Ele conquistou vários inimigos por conta disso, porque as pessoas parecem que gostam mais de ouvir mentiras. Sabe... na nossa idade a gente está sempre em busca de heróis e modelos que nos causem admiração. Tenho amigas que são fãs de pessoas falsas e fúteis que vivem em palácios e elas ficam tão fúteis como estas pessoas. Eu já decidi. Vou ser fã do profeta, pois ele fala a verdade e ama a Deus... então penso que seja um bom referencial para mim, né? Tchauzinho diário, até outro dia.

Olha eu aqui novamente. Não vou poder escrever muito, pois as coisas por aqui andam meio tensas. Meu amigo veio aqui bem depressa me trazer notícias que não são nada boas. É sobre a guerra. Disse que o exército já está aqui nas proximidades. Fiquei muito triste. Seria muito bom que todas as pessoas conhecessem o amor de Deus e parassem de brigar. Infelizmente as pessoas cultivam ódio, inveja e ganância dentro de si e acabam fazendo coisas más e isso não é nada bom. Meu amigo disse para tomarmos cuidado, pois esse exército não veio para brincadeira e que eles tem feito muitos reféns de guerra.  Fiquei apreensiva. Ele me deu um grande abraço apertado, como se despedisse de mim. Senti que era a última vez que iria vê-lo. Eu comecei a chorar, mas orei ao Deus eterno pedindo proteção sobre mim,  sobre ele e sobre a minha família. Independente do que acontecer, creio que Deus está no controle de todas as coisas, por isso, optei em confiar nele, como o profeta. Nessa situação de tensão é muito difícil confiar e entregar,  mas penso que é o melhor caminho.

Faz um tempão que não venho aqui, né? É que aconteceram tantas coisas que se fosse contar tudo, tintin por tintin daria para virar uma novela. Não estou com muito tempo para escrever, vou tentar ser breve. Sabe aqueles rumores de guerra que havia escrito? Eram reais e se tornaram em guerra de verdade. Foi horrível e só de pensar, fico assustada e dói o meu coração. Minha casa foi destruída por completo. Eu fui presa e trazida com outros prisioneiros a um país de uma língua estranha. Chorei muito e não me conformava com a situação. Cheguei a pensar que Deus me abandonou e apenas queria morrer. Foram noites e mais noites banhadas em lágrimas.

Numa dessas noites, lembrei de algo que havia prometido para mim mesma, que era "optei em confiar em Deus". Quando lembrei dessas palavras disse para mim mesma: Eu quero viver! Então mudei de postura e tentei dar o melhor de mim. Sei que sou inteligente e tenho me esforçado em aprender a língua desse povo. Sei que sou escrava aqui, então vou tentar ser uma boa escrava e aprender com a situação. Não é fácil, quando penso na minha terra e no meu povo,  tenho vontade de abandonar tudo e simplesmente morrer, mas preciso ter paciência e saber que Deus está no controle de todas as coisas. 

A casa onde vivo é muito bonita e tem muitos escravos. Não somos maltratados, pelo contrário, minha dona me trata bem e às vezes ganho presentes. Não sei se você vai me entender... Mas... Deus também ama essas pessoas aqui, não é incrível? Então se Deus os ama, vou tentar dar o melhor de mim para eles e em conseqüência a isso, sou muito bem tratada.

Dia desses, a cozinheira me pediu para ir a feira. Encontrei com uma amiga do meu vilarejo. Não me contive e pulei no seu pescoço, abraçando-a e beijando-a. Ela tinha marcas profundas de dor e de sofrimento. Não chorou, não sorriu. Tinha no seu olhar um ódio imenso e  dizia que odiava aquele povo, odiava seus donos, odiava a Deus por estar ali. Tentei amenizar o seu ódio. Perguntei-lhe se havia aprendido um pouco da língua e ela respondeu que não tinha interesse em nada daquele país pagão e que preferia morrer. Nisso, ela foi retirada dali bruscamente pelo seu amo.

Fiquei com dó de minha amiga. Um sentimento de revolta inundou o meu coração, mas ao retornar para a casa com as compras percebi que não adiantaria nutrir aquele sentimento de ódio e vingança dentro de mim, aquilo só me atrairia a morte e tudo o que eu queria era viver e ser livre para poder pisar o solo da minha pátria amada.

Poderia desejar o mal para os meus patrões e tentar envenená-los com meu olhar, com minhas atitudes, mas não sei ser assim. Eu me importo com eles. Na verdade, até gosto deles. Minha patroa anda triste, pois seu marido está muito doente. Ele já foi ao médico, mas essa doença não tem cura. Volta e meia vejo-a chorando pelos cantos da casa, mas quando me vê, disfarça e finge estar tudo bem.

Hoje acordei pensando no profeta,  não me contive e disse para a minha patroa.

- Lá na minha terra tem um profeta muito bom. Ele já ressuscitou um menino. Se meu patrão for lá falar com ele, tenho certeza de que ele vai ser curado.

Percebi um brilho no olhar de minha patroa e um discreto sorriso de gratidão. Ela saiu correndo e foi procurar o marido. Não sei o que conversaram, mas o percebi animado. Estava muito bem vestido e perfumado, pois tinha uma audiência com o rei.

Sei que sou uma simples escrava, mas meu coração ficou muito feliz em poder tentar reanimar a esperança aqui nessa casa. Talvez seja esse o propósito de Deus aqui nesse lugar, né?

Que correria. Só agora parei para descansar um pouquinho. Meu patrão vai viajar. Vai se encontrar com o profeta. E eu tive que ajudar a arrumar toda a sua bagagem. Eu acho que ele vai se mudar para lá de tanta coisa que está levando. Tem carros e cavalos repletos de comida e roupas. Acredita que ele está levando 350 kg de prata, uns 70 kg de ouro de dez mudas de roupa fina? Ele diz que quer dar de presente para o profeta. Você quer apostar que o profeta não vai aceitar nada disso? Se eu conheço bem aquele homem de Deus, tenho certeza que o curará de graça. Estou torcendo para que tudo dê certo, pois o patrão e a patroa só falam nisso aqui em casa.

Só estou preocupada com uma coisinha. Meu patrão está levando uma carta para o rei de lá. Esse rei não é muito sábio e faz coisas que não agradam a Deus e tenho quase certeza que foi por causa dele que estamos aqui. Espero que pelo menos dessa vez esse rei seja esperto um pouquinho e encaminhe meu patrão até o profeta.

Estava apreensiva por esses dias, por isso, nem vim aqui escrever. Meu coração tremia só de pensar se as coisas dessem tudo errado. Mas... adivinhe? O patrão chegou hoje e... CURADO! Esse nosso Deus não é muito bom?

Ele até trouxe uns sacos com a terra de lá. Ah... quanto peguei aquela terra comecei a chorar, pois é a minha terra. A patroa estava ansiosa e queria saber de tudo o que aconteceu. Na verdade, eu também queria, mas tinha muita coisa de viagem para arrumar. O patrão olhou para mim com o rosto cheio de gratidão e percebi que seu coração estava quebrantado. Ele tivera uma experiência com o Deus vivo. Ele ordenou que eu me assentasse ao lado da patroa e começou a relatar:

Menina! Assim que cheguei no seu país, entreguei a carta do meu rei para o seu rei. A carta dizia assim: "Esta carta é para apresentar Naamã, que é meu oficial. Eu quero que você o cure."  Quando o seu rei leu a carta, rasgou as suas roupas em sinal de medo e exclamou:

- Como é que o rei da Síria quer que eu cure este homem? Será que ele pensa que eu sou Deus e tenho o poder de dar vida e tirá-la? Ele está querendo briga!

O profeta Eliseu soube o que havia acontecido e mandou dizer ao rei.

- Porque o senhor está preocupado? Mande que esse homem venha falar comigo, e eu mostrarei a ele que há profeta em Israel!

Então eu fui com os meus cavalos e carros para a porta da casa do profeta Eliseu. O profeta mandou que um empregado saísse e dissesse que eu fosse me lavar 7 vezes no rio Jordão, pois assim ficaria completamente curado da minha doença. Eu fiquei muito zangado e disse:

- Eu pensava que pelo menos o profeta ia sair e falar comigo e que oraria ao Senhor, seu Deus, e que passaria a mão sobre o lugar doente e me curaria! Além disso, por acaso os risos Abana e Farpar, em Damasco, não são melhores do que qualquer terra de Israel? Será que eu não poderia me lavar neles e ficar curado?  E fui embora muito bravo.

Então meus empregados foram até o lugar onde eu estava e disseram:

- Se o profeta mandasse o senhor fazer alguma coisa difícil, por acaso o senhor não faria? Porque o senhor não pode ir se lavar, como ele disse, e ficar curado?

Pensei bem... Desci até o rio Jordão e mergulhei 7 vezes, como o profeta tinha dito. E... fiquei completamente curado. Minha carne ficou firme e sadia como de uma criança. Não me contive de tanta alegria e quis imediatamente procurar o profeta para agradecer. Quando o encontrei disse:

- Agora sei que no mundo inteiro não existe nenhum deus, a não ser o Deus de Israel. Aceite um presente meu, por favor!

O profeta respondeu:

- Juro pelo Senhor, o Deus vivo, a quem sirvo, que não aceitarei nenhum presente.

Eu insisti para que aceitasse, mas ele não quis. Então eu disse:

- Já que o senhor não quer aceitar o meu presente, então deixe que eu leve para casa duas mulas carregadas de terra, pois de agora em diante não vou mais oferecer sacrifícios e ofertas a nenhum outro deus, a não ser a Deus, o Senhor. Mas gostaria que ele me perdoasse uma coisa que é a seguinte: quando eu tiver que acompanhar o meu rei ao templo de Rimom, o deus da Síria, eu vou ter que adorá-lo também. Que o Senhor Deus me perdoe por isso!

O profeta simplesmente me disse:

- Adeus e boa viagem!

Enquanto meu patrão relatava isso, uma alegria imensa inundou todo o meu ser. Sei que Deus tem um propósito em todas as coisas e fico feliz em poder cumprir o propósito de Deus através da minha vida. Isso me faz me sentir livre. Continuo escrava aqui nessa casa, mas no meu coração eu sou inexplicavelmente livre, porque tenho o Deus Eterno no meu coração. Sinto saudades da minha terra sim e agora poderei pisá-la, graça as duas mulas carregadas dela. Fecho meus olhos pisoteando a terra  e tento imaginar a minha doce Israel, mas meus olhos vão além e contemplam um Reino muito mais lindo e perfeito, onde o Deus Eterno me espera de braços abertos.

Fim

Aurelina Silveira Ramos

03/07/2008

linolica@terra.com.br - linolica@yahoo.com.br

Nota da autora:

Hoje, pela manhã, pensava em Ingrid Betancourt. Há um tempo atrás, ao ler uma carta sua que circulou pela net, sobre sua situação como refém da FARC por 6 anos e da sua aflição de mãe, meu coração se condoeu. Entrei no meu quarto e comecei a orar e chorar e clamar por sua libertação. Ontem, ao ouvir o noticiário tive a feliz surpresa de ver essa mulher liberta. Não conheço Ingrid, mas um dia orei por ela e clamei por sua libertação e acabei me afeiçoando a ela. E como eu gosto muito de ficar pensando na Bíblia, fiquei pensando em alguém que passou por situação de seqüestro ou prisão. Lembrei-me da história de Naamã (2 Reis 5) que tinha uma criada que era uma prisioneira de guerra. Comecei a pensar e criei o diário de uma menina (uma vez minha irmã fez isso numa classe de juniores e foi bem legal). Espero que você goste, mesmo sendo menino, menina, mocinho, mocinha, senhorzinho, senhorinha e extraia lições preciosas e que apesar das lutas/prisões podemos ser vencedores em Cristo que nos resgatou. Os homens podem fazer suas atrocidades, mas o melhor caminho é optarmos por Jesus, porque só Ele liberta coração, alma e mente e espírito.

Quero saber mais a respeito de Jesus Cristo.

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